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Túmulo do ex-ditador fascita italiano Benito Mussolini atrai milhares de seguidores na Itália

O código de vestuário era rigorosamente preto. Os cantos nostálgicos – uma mistura de hinos fascistas e gritos de "Duce, Duce, Duce" – chegaram ao auge quando o desfile chegou no mês passado ao cemitério da cidade de Predappio, na Itália, a caminho de sua Meca: o túmulo do ex-ditador fascista Benito Mussolini.

"Por que vocês vêm aqui? Quem é esse Mussolini?", perguntou Tam Giulio, um padre da Sociedade de São Pio 10, uma seita tradicionalista católica que rompeu com o Vaticano há 20 anos. "Viemos agradecer este homem pelas ideias mais europeias, mais mediterrâneas, mais originais", respondeu o próprio Tam Giulio, figura conhecida em círculos de direita, antes de começar a recitar o rosário.

A cerimônia acontece três vezes por ano em Predappio para comemorar o dia do nascimento de Mussolini (29 de julho de 1883, em uma casa não muito longe do cemitério), sua morte (nas mãos de partidários em 28 de abril de 1945) e a chamada Marcha a Roma, que levou o partido de Mussolini ao poder na Itália em outubro de 1922.

"Tenho vindo aqui pelo menos uma ou duas vezes por ano, desde 31 de agosto de 1957, o dia em que trouxeram o corpo do Duce para cá", disse Marcello, um veterano de 85 anos que pediu que seu sobrenome não fosse divulgado. "Minha fé nele se manteve intacta."

Eles vão ao local em ônibus lotados, que saem de Turim ou Palermo, em uma espécie de peregrinação.

"São como cristãos que visitam São Pedro, exceto que aqui alguns usam o ‘fez’", disse Gianni, um homem corpulento de Turim, explicando o chapéu de feltro preto em forma de cone truncado que se tornou parte do uniforme dos camisas negras fascistas, usado aqui por um punhado de jovens meticulosamente preparados. "Mas não somos saudosistas, temos cartões de crédito. Não queremos restaurar aquela época, apenas não queremos negá-la".

Para muitos, trata-se da representação de uma época em que, segundo eles a Itália valia alguma coisa no mundo, em contraste com a situação de hoje.

"A Itália precisa de uma mudança. Estamos nas mãos de políticos que não são dignos do nosso voto", disse Enrico Cozzani, proprietário de uma empresa de segurança com sede em Lucca. "Somos a chacota da Europa."

Angelo Aquilani, coordenador do grupo de direita Destra Nuova Sociale, foi mais sucinto."Amamos o Duce", disse. "Ele é a nossa fé”.

Tal veneração pesou sobre os ombros dos líderes da Itália em 1945. Depois que Mussolini foi morto, seu túmulo ficou “obscuro” para evitar a criação de um santuário, à maneira como os oficiais militares no Conselho Nacional de Transição da Líbia decidiram enterrar Muamar Kadafi em um local secreto no mês passado e agentes americanos sepultaram Osama bin Laden no mar em maio.

Depois que o cadáver de Mussolini foi pendurado em ganchos de carne no dia 29 de abril de 1945, na Piazzale Loreto, em Milão, onde os cidadãos expuseram sua fúria contra o ex-líder, ele foi enterrado em uma vala comum em um cemitério próximo. Um ano depois, defensores neofascistas desenterraram o corpo e o esconderam em um convento na Lombardia até 1957, quando os restos mortais foram devolvidos à viúva de Mussolini, que os enterrou na cripta da família em Predappio.

Os esforços das autoridades italianas para esconder o local do enterro saiu pela culatra quando a sua localização rapidamente se tornou uma questão de intenso interesse.

"A vitalidade de Mussolini era grande enquanto o mausoléu não existia. Um cadáver que não está em nenhum lugar está em toda parte", disse Sergio Luzzatto, um historiador da Universidade de Turim, que escreveu "Il Corpo del Duce", sobre as vicissitudes do cadáver. O documentário "Il Corpo del Duce", inspirado no livro, será exibido no Festival de Cinema de Turim neste mês.

"Os italianos viveram a ausência do corpo como uma presença, portanto deram continuidade a história de amor entre eles e seu líder, que era, em muitos aspectos, bastante carnal", disse Luzzatto.

Essa história terminou quando o corpo foi devolvido à família e "tornou-se fixo e sepulcral", algo notado principalmente em livros de visitas ao túmulo, onde os visitantes podem assinar e deixar comentários.

Esses livros estão arquivados em uma sala no piso superior da Casa de Memórias, o museu de memorabilia do Duce aberto em 2001 por Domenico Morosini, um empresário bem sucedido da Lombardia, que antes era uma casa de veraneio de Mussolini. Os registros estão arquivados sob uma viga que contém a inscrição de uma citação de Mussolini: "Não é impossível governar os italianos, mas meramente inútil".

O museu atrai entre 2 mil e 3 mil pessoas por ano e poderia atrair mais, mas Morosini tem encontrado dificuldades para anunciar o local. Placas que orientam sobre a localização do museu "constantemente são derrubadas por esquerdistas", disse ele.

Na rua principal de Predappio, algumas lojas vendem memorabilia fascista, como a loja Tricolore Predappio, que vende desde cassetetes até calendários de Mussolini. Os calendários também são vendidos nas bancas de jornal, “onde saem mais que os calendários sexy", disse o jornaleiro Pierluigi Pompignoli, fazendo uma saudação com o braço direito a um grupo de visitantes alemães, que respondeu: "Sieg Heil".

O túmulo de Mussolini recebe entre 80 mil e 100 mil visitantes por ano, com picos durante as três comemorações, que nos últimos anos têm sido presididas por Tam Giulio. No domingo, durante um recital do rosário intercalado com comentários, ele alertou para a iminente invasão islâmica da Europa, acelerada pelos eventos no mundo árabe este ano e auxiliada por uma política liberal adotada no continente europeu e uma "juventude americanizada" aberta a heresias como o casamento gay.

"Mussolini estava certo. Ele estaria chorando em seu túmulo se visse que a Itália foi reduzida a isso", disse Tam Giulio (embora o casamento gay seja de fato ilegal na Itália). "Temos orgulho das Cruzadas", disse ele, atraindo aplausos altos da multidão.

Este é exatamente o tipo de turismo que o prefeito de centro-esquerda de Predappio, Giorgio Frassineti, preferia evitar.

"Recusamos o modo como as pessoas que frequentam as comemorações veem Predappio, mas também recusamos a visão das extrema esquerda que deseja cancelar sua história", disse Frassineti. "É apenas outro tipo de turismo."

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