
A história de uma grande mulher sozinha contra a ditadura brasileira foi um dos destaques do Festival de Cinema de Veneza 2024.
“Ainda estou aqui”de Walter Salles, traz Fernanda Torres no papel de Eunice Paiva, mãe de cinco filhos e cuja vida foi virada do avesso após o sequestro, prisão e desaparecimento de seu marido, o ex-deputado Rubens Paiva, vítima do regime militar e interpretado por Selton Mello.
Depois de algum tempo, ela e a filha mais velha também são detidas, torturadas e colocadas na prisão durante cinco longos dias. Uma vez libertada, a mulher é obrigada a se reinventar sem dinheiro e com as contas do marido bloqueadas. Então decide começar tudo de novo mudando-se para São Paulo, onde volta a lecionar.
O filme, baseado no livro homônimo do jornalista Marcelo Rubens Paiva, filho de Eunice, repousa quase inteiramente sobre as costas de Fernanda Torres, desde já candidata a melhor atriz no Festival de Veneza e que está sempre em primeiro plano, capaz de transmitir bem a angústia claustrofóbica e desesperada enfrentada por Eunice.
“Quando li pela primeira vez o livro de Marcelo Rubens Paiva, fiquei profundamente emocionado. Pela primeira vez, a história dos desaparecidos era contada a partir da perspectiva de quem ficou”, disse Salles em Veneza.
“Na experiência de uma mulher, Eunice Paiva, havia tanto a história de como vivenciar uma perda quanto o sinal da ferida deixada em uma nação”, acrescentou o cineasta, amigo da família desde criança.
“Nos sete anos em que trabalhamos em ‘Ainda estou aqui’, a vida no Brasil chegou perigosamente perto da distopia da década de 1970, o que tornou ainda mais urgente contar essa história”, afirmou Salles.
Marcelo Rubens Paiva, por sua vez, traçou um paralelo com as “muitas famílias que sofrem em Israel e Gaza”. “Frequentemente são as próprias mulheres que dirigem essas famílias”, salientou o escritor, que também tem cidadania italiana.
“Quando escrevi o primeiro livro sobre minha família, chorei muito, mas depois isso nunca mais aconteceu, a não ser quando fui ao set do filme e encontrei aquela casa, idêntica à minha, mas sem móveis, assim como quando fugimos para São Paulo”, disse.
“Ainda estou aqui” participa do concurso principal no Festival de Veneza, que termina no próximo domingo (8).